O mal dos livros

14/08/2006

004 - Genealogia

Mesmo que haja qualquer coisa de dura verdade nesta analogia de Dom Quixote e Sancho Pança, a nossa relação nunca foi como essa. O Jaime para mim é um… (deus, a nossa família é tão complicada!)… um primo, um irmão, um amigo, um amante. É o meu…amado.
Mas deixa-me explicar-te a genealogia. Ninguém ta explicou ainda e isso é-te mais do que devido. É muito simples até, mas, não sei porquê (e, de momento, nem quero tentar saber porquê), enredámo-nos todos, voluntária ou involuntáriamente, numa teia de enganos para quem estava de fora porque se trocaram nomes (e mesmo pessoas, como sabes… mas lá chegaremos…).
O meu pai era, de facto, sobrinho da tia Júlia. É por isso que a minha mãe sempre lhe chamou tia. E eu, de ouvir a minha mãe, chamava-a assim também.
O Jaime chamava-lhe avó Júlia porque ela fora casada com o senhor Augusto, verdadeiro avô dele, mas ela fora apenas madrasta do pai do Jaime.
Ou seja, eu e o Jaime se calhar nem somos suficientemente chegados por laços de sangue para sequer nos chamarmos primos. Mas embora vivessemos em casas diferentes, fomos criados como se fôssemos irmãos.
Aqui está o básico, antes me de meter na dor de aprofundar o assunto. Pensa nisto como uma história e começa a lê-la imaginando-nos a crescer como se fôssemos de facto primos ou irmãos.
Nós moramos com duas ruas de premeio, mas acabámos por fazer uma pequena família, eu e a minha mãe, o Jaime e a avó dele. É que, a toda a volta, para onde quer que se olhasse nos ramos da árvore geneológica, só havia mortos. E desses, evitava falar-se. (Principalmente do meu pai, porque a minha mãe nunca lhe perdoou o facto de ele se ter enforcado na cozinha, no dia do meu primeiro aniversário).
Embora fossemos vizinhos próximos, foi só depois da morte do senhor Augusto que começámos a frequentar mais a casa da tia Júlia. É um bocado parvo dizer “frequentar”, como se fosse um café, porque, na verdade, é a minha outra casa. Foi há tanto tempo que nem me lembro de quando comecei a sentir isso, que as duas casas eram uma, quase como se a casa onde vivia com a minha mãe fosse o quarto e a cozinha e a casa da tia Júlia, a sala, a biblioteca e o quarto do Jaime (o meu outro quarto).

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